06/03/2011

Comportamento Lúdico

Comportamento de Crianças - a importância do lúdico
Quando se trata de questões relacionadas à educação de crianças pequenas, muitos pais sentem a angústia de lidar com os limites em especial.
A partir dos dois anos aproximadamente, muitas crianças começam a desenvolver mais autonomia e a manifestar com mais força seus desejos, vontades e protestos frente a um desejo.
Nesse momento, muitas mamães e papais começam a enlouquecer e muitas vezes recorrem ao famoso tapinha.
A proposta deste artigo é discutir uma forma alternativa à punição física, seja esta um tapinha na mão ou uma surra.
Longe de propor soluções mágicas e imediatas, pensar em alternativas lúdicas é um proposta de aproximação do mundo adulto ao mundo da criança.
Um exemplo, muitas vezes a criança pequena se nega a ir ao banheiro quando acorda e a cada investida dos pais com frases objetivas e racionais, a criança se retrai e mantém a famosa birra ou o comportamento indesejado, se negando a ir ao banheiro.
Os pais lançam mão de argumentos muito pertinentes, como por exemplo, dizer a criança que ao acordar todo mundo precisa fazer xixi, depois escovar os dentes, que precisa ir para escolinha, que todos fazem isso e no entanto, para criança esse amontoado de frases nada significa.
Veja bem, as explicações são necessárias e devem ser mantidas, contudo não precisam ser a única forma de persuasão. Nesse momento, os pais podem lançar mão de brincadeiras, do tipo ver quem chega primeiro ao banheiro ou que um bonequinho (pelúcia, ou carrinho, boneca, etc) irá ao banheiro e vai fazer tudo antes da
criança e vai chegar primeiro ao banheiro.
Ex. Já que você não quer ir ao banheiro, vou levar o Sr. Caminhão para fazer xixi e escovar os dentes...
Encenar a situação com o brinquedo diverte a criança e trás uma referência do mundo infantil para algo que ela deve fazer.
É incrível como as crianças respondem com rapidez aos apelos imaginários e lúdicos que tragam o processo de aprendizagem de forma divertida.



Ludoterapia Comportamental

O que é ludoterapia comportamental ?
A ludoterapia é uma forma de psicoterapia cuja meta é promover ou restabelecer o bem estar psicológico do indivíduo através de atividades lúdicas; no contexto de desenvolvimento social da criança a atividade lúdica é parte do repertório infantil e integra dimensões da interação humana necessárias na análise psicológica (regras, cadeias comportamentais, simulações ou faz-de-conta, aprendizagem observacional e modelagem); esta possibilidade de uso integrado de diversas técnicas talvez explique a aplicação da ludoterapia a diversas questões relativas ao comportamento de crianças (traumas psíquicos, abuso sexual, retardo, adoção, orientação a filhos de dependentes químicos) e de adultos (Schaefer,1994; Silvares, 2001). Nas décadas de sessenta e setenta, o atendimento comumente realizado em terapia comportamental para criancas era realizado via implementação de  um programa que previa a administração de reforço positivo, punição, extinção, biofeedback e contrato de contingência dentre outras intervenções. Em alguns casos, as intervenções eram implementadas pelos pais com o mínimo de contato entre terapeuta e criança (Azrin e Foxx, 1974; Knell, 1993). Segundo Knell 1993), intervenções nas quais há pouco contato entre terapeuta e criança negligenciam a participação ativa da criança no atendimento e são pouco eficazes nos casos onde há conflitos entre a criança e os responsáveis pelas implementações de intervenções (em geral, os pais). O seguimento das orientações por parte dos pais é fundamental para o atendimento. Os principais fatores que afetam a adesão ao atendimento são o nível educacional dos pais, a empatia da terapeuta face aos sentimentos ou reações emocionais dos pais e interação terapeuta-cliente. O modelo de atendimento em ludoterapia apresentado a seguir foi elaborado a partir da especificação de alguns fatores que podem afetar a relação terapeuta-cliente  (Mettel, 1986).
Avaliação em ludoterapia comportamental
    A avaliação tem duração a proximada de três semanas e segue a seguinte ordem: entrevistas com os pais, visita à escola e sessões lúdicas com a criança. Nesta etapa, é solicitado aos pais registros sobre 1) o comportamento do filho, 2) a frequência de ocorrência do comportamento e 3) verbalizações do filho relacionadas à queixa principal; 4) escalas de temperamento; 5) questionário das atividades de vida diária, seguimento de regra, alimentação, atividades lúdicas e relacionamento social da criança (Windholz, 1988) e 6) um questionário específico sobre a queixa.
Visita à escola da Criança
    Realiza-se visita à escola com o objetivo de observar e registrar a interação da crianca com os colegas assim como contactar os técnicos da escola, como são realizadas as atividades solicitadas pela professora, brincadeiras com os colegas, autonomia nas atividades escolares e de vida diária exigidas pela escola (guardar os brinquedos com os quais brinca por exemplo).
Visita à casa da criança
    É realizada uma visita à casa com o objetivo de observar o comportamento da criança e o local da casa reservado às atividades lúdicas; a relação entre as regras da casa e o comportamento da criança e realização das atividades de vida diárias. A visita à casa permite observarcomo a criança explora os brinquedos nos espaços disponíveis para brincar; e a sequência de eventos que antecedem a ocorrência dos comportamentos inadequados. Em alguns casos é realizada intervenção no momento em que ocorre o comportamento (cf. exemplo em Gomes, 1998).
Sessões lúdicas de psicodiagnóstico
    São realizadas sessões lúdicas com o objetivo avaliar o comportamento lúdico da criança. Nas sessões lúdicas, realizadas com  a presença da mãe ou do pai conforme o nível de habituação e sensibilização da criança ao consultório, são registrados o tipo de brinquedo, número de brinquedos com os quais a criança brinca, preferência por brinquedos, qualidade do brinquedo, o uso funcional e o tempo de permanência em cada brinquedo (Windholz, 1988; Bomtempo, 1992). A avaliação das sessões lúdicas indicam 1) se e como a crianca reproduz nas sessões lúdicas acontecimentos do cotidiano (separação dos pais, a rotina diária e o padrão alimentação), 2) alteração no padrão lúdico (tempo de permanência nas atividades lúdicas comparativamente às crianças da mesma faixa etária), 3) comportamento assertivo e seguimento das regras estabelecidas na situação lúdica e 4) as informações fornecidas pela mãe sobre autonomia nas atividades de vida diária e relacionamento social foram corroboradas. O papel da terapeuta é reforcar as situações de autonomia da criança nas situações de escolha de brinquedos ou de autonomia (realizar a atividade sem auxílio).
Laudo
    A partir dos dados fornecidos pelos pais, observações nas sessões lúdicas no consultório, na escola e na casa da criança é elaborado e entregue aos pais um laudo por escrito que relaciona aspectos do ambiente físico (por exemplo, mudança de residência) e social (e.g., regras sociais), e a reação psicológica da criança.
Sensibilização é uma das formas mais elementares de aprendizagem e é definida como um aumento na força da resposta reflexa resultante da ocorrência de um estímulo novo e aversivo. Aprendizagem ocorre quando, gradualmente, o organismo se habitua à resposta sensibilizada, isto é, a resposta sensibilizada diminui após repetições do estímulo (Sato, 1995).
Recentemente, a relação entre habituação e temperamento tem sido estabelecida através de estudos longitudinais (Smith, Dixon, Jankowski, Sanscrainte, Davidson e Loboschefski, 1997); tais estudos mostram que a taxa de habituação de bebês (tempo de observação total, número de tentativas para atingir o critério de habituação e tempo de fixação de estímulos novos) é significativamente associada com cinco dentre nove dimensões de temperamento (adaptabilidade, nível de atividade, humor, distratibilidade, força da resposta e persitência).
Tais estudos podem ser relacionados aos trabalhos clássicos de Pavlov, Strelau e Eysenck sobre o papel do temperamento na adaptação do indivíduo ao ambiente; tenho sugerido em trabalhos prévios (Gomes, 1998; Coelho, 2000) que algumas dimensões de temperamento (e.g., adaptabilidade, nível de atividade, humor, distratibilidade, força da resposta e persitência) sejam agrupadas em dois fatores: habituação e sensibilização .
Intervenções
    As sessões lúdicas têm como objetivo de 1) habituar a criança às atividades lúdicas e, através de tais atividades, promover ou restabelecer o bem estar da criança enfatizando parte de uma cadeia de atividades de vida diária; e 2) reforçar positivamente a criança nos contextos de autonomia e assertividade. Os pais são orientados sobre aprendizagens inadequadas que podem ocorrer ao longo do desenvolvimento da criança. São discutidas crenças comuns aos pais (a aplicação do termo “culpa”, por exemplo, é aplicado de modo inadequado em casos de encoprese) e  os pais são orientados acerca das reações sobre as quais a criança ainda aprendeu a exercer controle. As atividades lúdicas são escolhidas pela criança. A biblioterapia, uso de livros para abordar temas específicos relacionados ao tratamento, é uma forma de intervenção utilizada para alcançar os objetivos estabelecidos (Coelho, 2000; Knell, 1993; 1994).
Conclusão
As intervenções psicológicas realizadas no contexto da ludoterapia (habituação e dessensibilização ao ambiente, biblioterapia, orientação aos pais e seguimento das instruções) possibilitam o restabelecimento do bem estar do indivíduo. A participação dos pais no atendimento é essencial para que 1) as crianças avaliem o consultório como um ambiente agradável e de confiança.
Matheny (1991) e Gomes (1998) sugerem que sensibilização e habituação em situações lúdicas e no comportamento exploratório sejam interpretados como medidas de temperamento infantil. Por exemplo, as escalas de temperamento de Presley e Martin (1994) procuram especificar reações mais frequentes das crianças diante de mudanças nas condições do ambiente físico e social sensibilização.    
Referências bibliográficas
Azrin, N.H. e Foxx, R.M. (1974) Toilet training in less than a day . New York: Simon and Schuster.
Bomtempo, E. (1992) Brinquedoteca: espaço de observação da criança e do brinquedo. Em O Direito de Brincar: A Brinquedoteca . São Paulo: Scritta Editorial.
Bosa, C. A. e Piccinini, C.A. (1994) temperamento infantil e apego mãe-criança: considerações teóricas, Psicologia: Teoria e Pesquisa, 10, 193-212.
Gomes, L.S. (1998) Um estudo de caso de encoprese em ludoterapia comportamental. Psicologia: Ciência e Profissão, 3 , 54-61.
Coelho, L.S.G (2000) Encoprese e constipação em gêmeos: um estudo de caso em ludoterapia comportamental. Psicologia: Ciência e Profissão , 5, 56-64.
Knell, S.M. (1990) Cognitive-behavioral play therapy in the treatment of encopresis, Journal of Clinical Child Psychology, 19, 55-60.
Knell, S.M.(1995) Cognitive Behavioral Play Therapy. New Jersey: Aronson.
Neri, A.L. (1987) Modificação do comportamento infantil. São Paulo: Papirus.
Mettel, T.P.L. (1986) A relação terapeuta-cliente sob o enfoque comportamental: algumas considerações. Em J.L.O. Bueno (Org.) O estudo do comportamento: pesquisa e prática no Brasil. Sociedade de Psicologia de Ribeirão Preto.
Sato, T. (1995) Habituação e sensibilização comportamental, Psicologia USP, 6, 231-276
Schaefer (1994) Play therapy for psychic trauma in children. Em K.J. O´Connor & C.E. Schaefer Handbook of Play Therapy. Advances and     Innovations. New York: Wiley.
Silvares, E.S. (2001) Ludoterapia cognitivo-comportamental com crianças agressivas. Em H. J. Guilhardi; M. B. B. P. Madi; P. P. Queiroz e M.C. Scoz (Orgs.). Sobre Comportamento e Cognição vol 7.  1 ed.  Santo Andre,  p. 189-199.
Smith, P.H; Dixon, W.E.; Jankowski, J.J.; Sanscrainte, M.M; Davidson, B.K.; Loboschefski, T. (1997) Longitudinal relationships between habituation and temperament in infancy, Merrill-Palmer Quarterly, 43, 2, 291-304.
Walten, F.N. (1979) Habituation model of systematic desensitization, Psychological Bulletin, 86, 3, 627-637.
Windholz, M. H. (1988) Passo a Passo, seu caminho. Sao Paulo: Edicon.

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